Este é mais um exemplar da coleção "produções que poderiam ser espetaculares e acabam na galeria da ruindade", infelizmente. AdP (Anéis de Poder) pode ser analisado sob o prisma de dois públicos diferentes: os não conhecedores da obra de Tolkien, que ficarão profundamente desinteressados pelo do universo da Terra Média, e os já familiarizados com a obra, que ficarão profundamente revoltados com o que viram. Em ambos os casos um resultado ruim.

AdP é composta por núcleos distintos: elfos, anãos (sim, anãos, segundo o canon de Tolkien), orcs e humanos, humanos de Númenor e os "projetos de hobbit" com os misterioso mago. O que eles tem em comum? O conflito que empurra e dá nome à série, tudo gira em torno da criação dos anéis de poder que serão controlados pelo O Um Anel a ser forjado por Sauron, que "retorna" para dominar a Terra Média e instaurar seu reino de poder tirânico.

A premissa, ainda que simples e que se desdobra nas mãos de Tolkien em um universo espetacular, virou um verdadeiro pesadelo para os showrunners Patrick McKay and JD Payne. Certamente eles não compreenderam ou não estudaram suficientemente a fundo os fundamentos que tornam a obra de Tolkien memorável. Fundamentos estes que foram razoavelmente bem captados na adaptação cinematográfica realizada por Peter Jackson na trilogia A Sociedade do Anel, As Duas Torres e O Retorno do Rei, destacando o confronto do bem e do mal e a urgência em se tomar posição diante de um cenário tão ameaçador. Contudo, Patrick e Payne decidiram "melhorar" a obra clássica (e eu não sei se dou risadas ou choro com esta declaração) e colocar a sua visão, mais moderna, mais "adequada" aos nossos tempos.

Assim, eles providenciaram que a divisão e o conflito entre o bem e mal se dissolvesse na série, mostrando orcs que originalmente são criaturas desprezíveis e maléficas em oprimidos que "apenas" desejam ter o seu lugar na Terra Média. Também ignoraram ou retrataram inadequadamente a imensidão da Terra Média que pode ser expressa em longas jornadas, cenários abertos, ricos e diversos fazendo os personagens se deslocarem em um piscar de olhos que parecem mais um tele transporte. E fizeram muito pior, a adaptação de personagens e cronologia é pobre e preguiçosa, que mal se assemelha ou representa uma referência aos originais. Criaram uma bizarra relação de atração e ódio entre Sauron e Galadriel, algo que nunca existiu. Galadriel, na era que a série retrata, seria uma das mais poderosas mulheres élficas, considerada entre todos um expoente de sabedoria, algo muito distante da personagem infantilizada, imatura e chata a dar com pau que AdP apresenta. E essa pobreza criativa se aplica a maioria dos personagens da série que, ou são fracos, ou idiotizados. Diante da ameaça de um mal iminente eles são claudicantes, sem iniciativa, confusos e chatos, muito chatos, fazendo com que qualquer perspectiva mais heroica por parte deles se dissolva no ralo da fraqueza dos seus caráteres.

Anéis de Poder começa com um primeiro episódio razoável e vai progressivamente afundando ao longo da temporada. Nem os dois episódios finais, predominantemente focados em ação e que poderiam ser um ponto alto da temporada conseguem puxar a série do buraco em que ela se enfiou. Quando analisada a batalha final se revela confusa, pouco verossímil, mal produzida e planejada. Não há muito para se dizer sobre a série; se comparada aos filmes de Peter Jackson chega a ser desanimadora e com relação a obra escrita de Tolkien, desastrosa.